Livros, viagens e vinhos formam uma combinação quase imbatível!
Assim, quando comprei o livro “A História do Romanée-Conti e
a Trama para Destruir o Melhor Vinho do Mundo”, do jornalista americano
Maximillian Porter, já desconfiava que ele poderia render uma página para o Ler
& Viver, mas não tinha certeza.
A tal trama para destruir os vinhedos da Romanée-Conti (DRC),
estrela maior da produção de vinhos da região de Borgonha, no leste da França, tem início quando
em 2010 um ex-presidiário oriundo da região de Champagne tentou envenenar as vinhas do Domaine como forma de extorquir seus proprietários e com isto obter
um resgate valioso.
A trama policial não rendeu um romance de primeira grandeza. Situo a narrativa da investigação francesa a léguas
de distância das sofisticadas conclusões de um Poirot ou da ação cerebral de um
Holmes, que nos fazem investir em noites de insônia para chegar o mais depressa possível ao criminoso e depois ficar lamentando porque o livro acabou tão rapidamente.
Mas o livro tem suas qualidades para quem viaja na leitura. Pois, narrar da tentativa de extorsão permitiu ao autor contar a história da vinicultura na
Borgonha, desde o período do império Romano, passando pela chegada dos monges
beneditinos na região na baixa idade média, pela história da
compra da vinícola pelo Príncipe Conti, primo-irmão do Rei Luis XV da França e
adversário político da famosa Madame Pompadour, com quem disputou a compra
dos já famosos vinhedos da Côte D’Or, até chegar à família Vilaine, atual
proprietária do DRC e protagonista do evento policialesco narrado no livro.
Assim, apesar de um romance policial de qualidade sofrível, o livro vale
pelas interessantes informações que traz sobre os vinhos da região e do mundo, informações
e explicações sobre a história da vinicultura na França e especialmente na
região de Borgonha; explicações sobre as denominações de origem controlada,
sobre o funcionamento do mercado de vinhos ou sobre como os vinhedos e os
vignerons franceses sobreviveram às as duas grandes guerras deste século XX.
Coisas que são interessantes para quem aprecia o vinho ou que podem ser usadas
para animar uma conversa entre amigos quando o papo no restaurante já começa a perder
ritmo. Tipo: saber o que representa a classificação “Gran Cru”, coisa que eu até então
ignorava; ou, a curiosa história do “Julgamento de Paris”, em meados dos anos
70, quando os cabernet e os chardonnay californianos venceram seus rivais de
Bordeaux (os tintos) e da Borgonha (os brancos) em uma prova de degustação com a participação de
renomados conhecedores do vinho, a maior parte deles franceses!!
Mas o bom mesmo do livro é voltar à Dijon e à Borgonha! São as
referências à cidade, à Beaune, à Autun e às muitas pequenas vilas pelas quais
se vai apreciando a maravilhosa paisagem das pequenas fazendas, dos vinhedos e
de uma vida que corre, pelo menos na aparência, de uma forma tranquila e
pacata.
Dijon, a principal cidade da Cotê D’Or e da região, foi sede de Reino, de Ducado e é uma das cidades mais charmosas que conheci. O centro histórico da
cidade, patrimônio da UNESCO é bem grande e oferece um sem número de atrações para quem está de passagem ou para quem pretende gastar alguns dias
aproveitando as delícias da região.
Lá chegamos no começo da noite e nos hospedamos no Hotel Wilson que,
inicialmente, causou uma má impressão porque parecia uma casa de taipa, de tão
baixa que era a edificação. Depois descobrimos que o hotel era muito antigo e o
que havia subido era o nível da rua, ou seja, o prédio não era baixo a calçada
é que era alta e, ao contrário do que temíamos, era agradável, aconchegante e
muito bem localizado.
À noite Dijon é linda! Os principais monumentos recebem uma iluminação
especial que destaca seus traços mais imponentes e atrai a atenção do visitante
para os pontos altos da cidade, a começar pela belíssima Place de La Liberátion
com seu arco de colunas, que fica de frente para o antigo palácio ducal que
hoje abriga o Museu de Belas Artes.
De lá, as corujas – símbolo da cidade – formam uma trilha com setas de
bronze que orientam os turistas em um passeio por todo o centro histórico, não
deixando que você perca nenhuma das principais atrações da cidade, recheada de belas igrejas e interessantes prédios e museus. Mas à noite,
com frio, o bom mesmo é ir para o Marché des Halles, que nesta hora estará
fechado, e escolher um dos vários restaurantes que ficam à sua volta para
apreciar a comida da região e, é claro, os vinhos.
À luz do dia a cidade é ainda mais bonita e cheia de vida. As ruas do
centro ficam cheias de pessoas e de animação. Mesmo nos dias mais frios, as lojas, os
cafés, os restaurantes, os museus e as esquinas da Rue da La Liberté e de seu
entorno estavam ocupados, sem estarem lotados. As pessoas tomavam a cidade para
si e isto fazia que houvesse este clima de tranquila segurança, que faz
com que se queira passear por todos os lugares, entrar em cada beco, sentar
em cada pracinha e observar a vida acontecendo.
Mas a Borgonha é mais que Dijon. A estrada que liga Dijon a Beaune, a
capital dos vinhos, passa pelos principais vinhedos da região e deve ser de uma
beleza cinematográfica no período da safra. Em novembro, quando por passamos
por lá, as videiras já estavam descansando, esperando a chegada da primavera
para voltar a produzir, assim o campo está praticamente sem movimento.
Mas os
campos verdes, as pequenas propriedades rurais com suas vacarias, seus cavalos
e suas outras criações, as variedades de cores do fim do outono, saindo de um
verde escuro, passando por várias tonalidades de verde, laranja, amarelo, marrom e vermelho,
dão a quem passeia pela região a impressão de que seria possível, para qualquer
um, pintar um belíssimo quadro ou tirar aquela foto premiada.
Sentado em uma antiga cerca de pedras do período romano, apreciando um
delicioso Pinot Noir enquanto o sol da tarde explorava todas as possibilidades
das cores na paisagem dos campos nas imediações de Autun, não há como não
concordar com Porter quando ao final do seu livro diz “que a vida é boa, não importa que mal possa haver no mundo, existe a Borgonha, existe o vinho,
existe luz, existe o amor”.
Muito legal! Depois desse relato, eu preciso colocar Dijon a minha lista de locais que desejo conhecer.
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