sábado, 5 de dezembro de 2015

Arbeit macht frei...





Arbeit macht frei... O trabalho liberta!

A frase inscrita no portão do campo nazista em Dachau, na Baviera, poderia até ser entendida como um exemplo da fina ironia do Terceiro Reich, não fosse a sombria verdade sobre aquele que se converteu no protótipo para uma dos mais atrozes instrumentos da máquina de guerra alemã durante a Segunda Guerra Mundial: os campos de concentração.

Não fosse, ademais, o fato que naquele campo, e apenas nele, mais de 30 mil vidas teriam sido ceifadas e outras centenas de milhares tiveram seus corpos torturados e suas almas mutiladas.

Hoje, o campo de concentração de Dachau é um museu aberto ao público de todas as nações e um passeio de fácil acesso, especialmente para aqueles que estão passando uns dias na belíssima cidade de Munique, distando cerca de 20 quilômetros da capital da Baviera.

Dachau, a cidade que lhe empresta o nome, é uma pequena e simpática urbe, como muitas típicas da região, com seus vinte e poucos mil habitantes, com casinhas alinhadas, ruas agradáveis de paralelepípedo, uma igreja protestante reconstruída depois da segunda guerra e uma tranqüilidade que, para alguns, pode ser até entediante.

Além do campo de concentração, a outra atração raramente visitada pelos turistas que para ali se deslocam, é o Palácio da cidade. Primeiro palácio de verão da dinastia Wittlesbach, Duques da Baviera, o palácio foi originalmente construído entre 1508 e 1579. Durante o Século XVIII o Palácio passou por sua primeira grande reforma e mais adiante, já no Século XIX, durante seu reinado, o Rei Max Joseph I demoliu 3 das 4 alas do palácio, de modo que para o visitante de hoje, o Palácio é uma belo edifício do Século XIX, com um café exclusivo, que proporciona uma muito bela vista da cidade e dos seus arredores.

O campo de concentração, assim, é a principal atração e motivação para os turistas que visitam Dachau. Estivemos lá em um lindo dia de outono. O céu estava de um azul de cinema e a temperatura era mais que agradável para um passeio ao ar livre. Mesmo assim, era impossível não sentir a atmosfera opressora do ambiente, a começar das grades de ferro dos portões, passando pelas celas em que muitos ficaram presos por anos a fio ou dos relatos de passagens mais horrorosas e torturas praticadas contra aquelas pessoas de uniforme listrado, coisas absolutamente inconcebíveis...

Por conta do seu caráter de protótipo, foi no campo de concentração de Dachau muitas das técnicas de tortura foram inicialmente testadas, como também, foram diversos os experimentos realizados com seres humanos, desde os mais simples, como para testar quanto tempo uma pessoa conseguiria sobreviver em água em temperaturas congelantes, até testes com drogas e tratamentos experimentais os mais horríveis. Isso sem falar da visita aos fornos onde milhares de corpos foram queimados ou nas salas de banho com chuveiros de gás venenoso.

A mim, pareceu-me impossível circular pelas dependências do campo de concentração sem sentir pesar sobre mim a tragédia de muitas gerações. Angústia pelo sofrimento das pessoas que foram brutalizadas naquelas dependências, despidas da mais elementar condição de humanidade, mas igualmente deprimido por aquelas pessoas que foram capazes de cometer tamanhas atrocidades, pessoas que, provavelmente, 10 anos antes você as encontraria em um café no centro de Munique lendo o jornal ou saindo do trabalho em uma indústria depois de mais um dia para tomar uma cerveja no caminho para suas famílias. Homens e mulheres respeitáveis que durante anos sujeitaram às piores condições homens e mulheres igualmente respeitáveis, apenas porque eram judeus, ciganos, negros, gays ou opositores do regime.

Essa atmosfera de opressão, em menor medida, contamina o livro A Costureira de Dachau escrito pela inglesa Mary Chamberlain. O livro conta a história de Ada Vaughan, uma jovem londrina, de origem humilde, muito bonita e exímia costureira, que no auge dos seus 19 anos se apaixona por um homem mais velho, um charmoso conde austro-húngaro e, contrariando seus pais e sua patroa de um ateliê de costura, resolve passar um fim de semana com seu novo amado em Paris. Às vésperas do início da guerra!

O idílio amoroso dos primeiros dias do romance logo se transforma em clima pesado e sofrido quando a guerra estoura e no esforço de fugir de volta para a Inglaterra via Bélgica, Ada finda abandonada pelo seu querido Stanislau na cidade de Namur logo quando os exércitos alemães iniciam o cerco à cidade. Desamparada e em desespero, Ada consegue abrigo em um convento da cidade e disfarçada como na pele da Irmã Clara é transferida, junto com as outras freiras de origem inglesa, para trabalhar em um asilo para idosos no centro de Munique.

Neste asilo ela conhece Herr Weiss, um velho e tarado professor que abusa da Irmã Clara e, em troca de favores sexuais consegue que a moça vá trabalhar como costureira para a mulher do comandante do campo de concentração de Dachau. É nesta casa, em regime de quase escravidão, que Ada∕Clara vai passar a maior parte dos cinco anos da guerra, sofrendo com a perda de seu bebê e sendo vítima de abusos e maus tratos, tanto dos donos da casa como do nobre professor Weiss, que vez ou outra vem visitá-la.

Nem mesmo o fim da guerra, sua libertação do casa do comandante do campo de concentração e do seu retorno para a Inglaterra, fazem com que o clima do livro se torne menos soturno ou menos triste. A recepção quando da sua chegada a Londres é pior que ela podia imaginar e a vida na capital inglesa depois da guerra é sofrida e especialmente difícil para uma mulher sozinha.

Mesmo que a história flua bem e a leitura seja agradável, o sofrimento e as agruras de Ada são nossa companhia durante praticamente toda a leitura do livro, desde o seu abandono em Namur até a última página. Os breves momentos da história que proporcionam o afastamento dos terrores da guerra e de suas seqüelas, logo se dissipam e o clima soturno e opressor da dura realidade retorna. 

Mais ou menos como na visita ao campo de concentração, o livro nos deixa com um sentimento de que existem momentos em que a humanidade é tão paradoxalmente desumana que não há como compreendê-la, traduzi-la ou aceitá-la.

O sexismo, o racismo, a nossa incapacidade de aceitar e respeitar o diferente, o outro, o alterno é tão presente, tão comum que não há como visitar ou ler sobre Dachau e não pensar no Charlie Hebdo, na Boate Bataclan, nas torres gêmeas, nas chacinas de jovens nas favelas brasileiras ou na aterrorizante imagem de assistir a um ser humano (???) assassinar outro com uma pedrada na cabeça enquanto ele dormia em uma cidade qualquer desse nosso Brasil, só porque morava na rua.


Às vezes a vida, não o trabalho, liberta o que há de pior em nós!!!!!

domingo, 20 de setembro de 2015

Catarina, Mecenas da Rússia...


A Nevskiy Prospect é a principal artéria da cidade de São Petersburgo na Rússia. Partindo de uma das esquinas do parque em frente ao Almirantado, vizinha à praça do Hermitage com seu imponente obelisco, a avenida corre numa diagonal até alcançar a Estação Moscou, de onde partem trens que ligam a Veneza do Norte à capital Russa.

Para os que esperam um bulevar, ao estilo Haussmanniano, tal qual uma versão russa da Champs Elisee de Paris, se decepcionarão. A avenida, projetada por Pedro, o Grande, cerca de um século antes das idéias do Barão Haussmann influenciar as urbes de todo o mundo, está mais para uma versão local da Broadway novaiorquina, claro que sem contar com o Time Square.

Isto em nada desmerece a avenida que, se o clima ajudar, deve ser aproveitada com uma caminhada sem pressa, apreciando cada uma de suas esquinas e canais. Ademais dos palacetes da rica nobreza russa, dos imponentes prédios comerciais e de muitas agências bancárias e casas de câmbio, várias das principais igrejas de São Petesburgo estão alinhadas com a avenida, a começar pela imponente Catedral de Nossa Senhora de Kazan, com sua pretensão de replicar na Rússia Czarista o estilo da Catedral de São Pedro em Roma.

De frente para a Catedral, do outro lado da avenida, às margens do canal Griboedov, está o interessante prédio da Companhia Singer, construído em estilo art nouveau, com uma excelente livraria (para russos, é claro!) e seu famoso café. Lançando o olhar mais adiante, seguindo as calmas águas do canal à sua frente vê-se, colorida e imponente, a Catedral do Sangue Derramado, mandada construir por Alexandre III no exato local onde um atentado promovido por anarquistas russos levou a morte de seu pai, o Tzar Alexandre II, no ano de 1881.

Seguindo mais adiante, passando por bancos, restaurantes, barzinhos bem simpáticos, pelo Palácio Stroganov (sim, eles mesmos, que inventaram o famoso estrogonofe) e mais igrejas, alcança-se uma aprazível pracinha, bem arborizada, a Ploshchad Ostrovskogo, também conhecida como Jardins de Catarina, por abrigar uma estátua de Catarina, a Grande.

Ao redor da praça estão outros dois importantes marcos da avenida: o prédio principal da Biblioteca Nacional da Rússia, a mais antiga biblioteca oficial do país, com cerca de 33 milhões de títulos, incluindo o mais antigo manuscrito em idioma russo, de 1057, e o Teatro Alexandrinsky, o mais antigo teatro nacional russo, fundado em 1756.

Sentando em um banco da praça me pus a pensar quão surpreendente saber ser esta a única estátua na cidade de São Petersburgo – em local público – a homenagear a princesa alemã que ascendeu ao trono russo depois de um golpe de Estado e que governou o país por mais de trinta anos, transformando, modernizando o Império Russo, deixando marcas indeléveis na cidade de São Petesburgo e seus arredores.

Silvia Miguens, no seu livro, Catarina, a Grande, deixa que Figchen, nos conte sua trajetória de vida. De uma criança herdeira da pequena nobreza alemã, nascida com o nome de Sofia Augusta Anhalt-Zerbst, Princesa de Holstein, que sofria de graves problemas de coluna que a obrigaram a usar um espartilho horroroso até a adolescência, viveu uma infância relativamente tranqüila nas terras de sua família e se tornou “Sua Majestade, Catarina II, imperatriz única e soberana de todas as Rússias” quando contava com 33 anos de idade.

Os livros de história nos contam a trajetória de Figchen-Catarina como a da mulher poderosa, que conspirou com amigos e amantes para derrubar e depois matar seu marido: o politicamente fraco e inconstante Pedro III. Muitos não acreditam que ela tivesse conhecimento desta parte do plano mas, coincidentemente, o assassino de Pedro foi o irmão Orlov mais novo. O golpe de Estado, dado quando o reinado de Pedro contava com menos de seis meses, a levou a assumir o trono da Rússia, formar uma aliança com a grande nobreza do país e com base nela governar por quase 35 anos, transformando seu país em uma das potências mundiais no final do século XVIII.

Já o livro de Silvia Miguens é narrado na primeira pessoa, como se fossem as memórias da Imperatriz, apresentando ao leitor como Figchen percebia e enfrentava as muitas situações desafiadoras que se colocaram ao longo de toda sua vida.

Ao descrever sua relação com Pedro Ulrico, o futuro Czar, Figchen é muito sincera ao reconhecer que “amava o tio George (sua paixão de adolescência), amava seus jogos, as suas idéias e a sua vitalidade. Mas também amava a possibilidade de reinar sobre o que ouvira serem vinte milhões de súditos. Sem dúvidas, com tio George era amor e com Pedro Ulrico não havia amor possível, via-se bem que se tratava apenas de um pacto”. E mesmo reconhecendo tal, não refreou sua ambição de governar a Rússia, ou melhor, usando as palavras que a autora pôs em sua boca, em uma conversa com sua mãe Catarina teria dito: “Não. Não quero governá-la; quero ser a Rússia. Devo ser a Rússia, a verdadeira mãe-pátria do povo russo”.

O marido mostrou-se não apenas inapetente nas artes do amor e da conquista, mas também e principalmente, despreparado para governar, fazendo com que os grupos de oposição a ele se fortalecessem dentro da própria Corte. Ainda assim, geraram Paulo, o herdeiro do casal, que logo foi tirado de seu convívio para viver com a sogra, a Tzarina Isabel. Prática que Catarina repetiria com os herdeiros de seu filho, apesar das queixas que tivera da sogra.

O fato de ter cumprindo as expectativas da Corte, gerando o Tzarevich, não afastou o futuro Tzar de suas amantes e seus brinquedos, muito menos a Czarina de seus favoritos, como o Príncipe Potenkim, que a ajudou a expandir a fronteira sul da Rússia, conquistando vastos territórios aos Otomanos e colonizando as estepes sul da Ucrânia; Stanislau Poniatowsky, que ela ajudou a se tornar rei da Polônia; ou como Gregory Orlov, provável pai de um dos filhos ilegítimos de Catarina e que, ou morreram ao nascer, ou foram enviados para serem criados por famílias da pequena nobreza russa, distantes de São Petersburgo.

Também no campo político logo ficaram claras as disputas entre a imperatriz, o Tzar e sua favorita, que procurava de todas as formas assumir o papel de rainha e tentava manter Catarina afastada das coisas do Império. Seu afastamento da corte, alojada no Peterhof, nas imediações de São Petersburgo, não apenas ajudou a esconder mais uma gravidez não planejada, como permitiu que ela conspirasse com os nobres leais – especialmente os irmãos Orlov – que em 9 de julho de 1762 desencadearam o golpe de Estado que a levou ao trono e mandou Pedro III para a prisão e depois para a morte.

O governo de Catarina navegou entre o conservadorismo de medidas que davam cada vez mais poder à nobreza russa, os boiardos, que exploravam brutalmente os camponeses e servos em toda a Rússia, e o iluminismo que florescia por toda a Europa, onde Catarina mantinha correspondências e amizade com figuras como Voltaire, Diderot e Montesquieu. Catarina personificava o despotismo esclarecido da Rússia e governou com base nesses princípios.

Para nós que visitamos São Petersburgo, a marca de Catarina está evidente em, pelo menos, duas das principais atrações da cidade: o Museu do Hermitage e o Palácio de Catarina, em Tsarkoe Selo, a cerca de 50 Km do centro da cidade.

Foi Catarina, amante das artes e dos intelectuais, que patrocinou a transformação do Palácio de Inverno dos Tzares no hoje mundialmente famoso museu do Hermitage, quando em 1764 financiou a aquisição de mais de duzentas obras de artistas flamengos e alemães, que formaram o núcleo original de sua coleção. Nos anos seguintes a Tzarina orientou a seus embaixadores por toda a Europa a comprar as coleções de nobres falidos ou de herdeiros que não viam valor nas peças, fazendo que o acervo do museu crescesse ano a ano.

Hoje, o Hermitage apresenta um acervo comparável com os existentes em museus como o Louvre, o Met ou o Prado. Porém, o museu de São Petersburgo supera todos eles por conta da beleza do prédio. São salões e mais salões que impressionam tanto pelas obras expostas, como pela suntuosidade de suas colunatas, escadarias, janelas e pisos. A profusão de dourados da Capela Imperial, a beleza da sala do trono, que é de tirar o fôlego, ou as escadarias construídas por Rastrelli, ainda no reinado da Tzarina Ana Ivanovna, por si só justificariam a visita ao museu.

Dizem que para apreciar toda a riqueza do Hermitage o visitante levaria uma década, ou mais!!! Felizmente para nós visitantes, que temos apenas poucas horas para dar conta desta imensidão, saber da impossibilidade de ver tudo, facilita que nos conformemos em escolher os pontos altos em exposição, pegar um mapa (mesmo assim correndo sério risco de se perder na imensidão do museu) e apreciar toda a beleza à sua volta.

Já o Palácio de Catarina, em Tsarkoe Selo, não oferece ao visitante uma coleção de arte como a do Hermitage. Localizado nas imediações de São Petersburgo, chegar lá por meio de trem ou ônibus é viável, mas considerando as dificuldades de entender o alfabeto russo e de se comunicar no idioma, já que são poucos os russos que falam inglês, o melhor mesmo é tomar uma excursão. Várias delas são oferecidas todos os dias na própria Nevskiy Prospect, nas imediações do Gostiny Dvor, o mais antigo shopping Center da cidade, construído na segunda metade do Século XVIII. Por segurança, talvez seja melhor contratar o pacote no hotel, mesmo.

Chegando lá, prepare-se para se assombrar com a beleza do Palácio de Catarina. Sua fachada de um azul delicado, esconde um palácio com uma arquitetura suntuosa, que une traços do barroco italiano com a tradição russa. Abusa-se do dourado e, segundo a opinião da guia Russa, que falava um espanhol fluente, a Galeria Dourada do Palácio supera em beleza a galeria dos espelhos do Versalhes. Se não a supera, concorre de igual para igual e o quarto de âmbar, este sim, é difícil de descrever.

Com todas as paredes cobertas com placas da resina fossilizada, o quarto explode em uma mistura de tons de amarelo, laranja, dourado, vermelhos e marrons que deixa o visitante boquiaberto. Apesar de desmontado, dado por desaparecido e parcialmente destruído durante a Segunda Grande Guerra, o impressionante esforço do povo russo, especialmente do povo de São Petersburgo, conseguiu devolver ao mundo, há menos de dez anos, este maravilhoso patrimônio da arte russa. É imperdível

Na saída, antes de tomar o caminho de volta para o centro da cidade, vale a pena apreciar os belos jardins que contornam o Palácio de Catarina ou, se o horário permitir, dar uma esticadinha para conhecer o Pavlosvky, o palácio construído por seu filho Paulo, nos terrenos que Catarina destinou para o seu sucessor quando do nascimento do seu primeiro neto. O palácio não tem a ostentação dos dois anteriores, pelo contrário, é pequeno e sóbrio quando comparado ao de Catarina ou ao Palácio de Inverno, mas tem belos jardins e, de fato, é um dos poucos palácios que conheço que dá a impressão que famílias normais ali viviam.

Ao chegar de volta ao centro, você pode até estar satisfeito com os passeios, mas assim como os mais de trinta anos de governo de Catarina, a Grande, transformaram a Rússia muito além da sua contribuição como mecenas das artes e da arquitetura, São Petersburgo também tem muito mais que o Hermitage e Tsarkoe Selo.

Mas não adianta tentar apreender tudo isto de um só golpe. No caminho de volta para o seu hotel, provavelmente mais uma vez passando pela Nevskiy Prospect, aproveite o gostoso fim de tarde para parar em um dos muitos cafés da avenida, tome uma vodka gelada e aprecie a beleza das cores da Veneza do Norte. Amanhã tem muito mais Rússia para visitar.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

O escritor que roubava livros ou...


Era sexta de manhã, eu estava tomando café com meus pais em Brasília, quando meu pai me passou o livro do Miguel Sousa Tavares que trouxera de viagem recente a Lisboa.
O livro chamava-se Não se encontra o que se procura e ele, ao me passar o volume, foi logo alertando: - Ainda não li este livro que trouxe de Portugal, mas sua mãe já leu e disse que parece muito com as coisas que você tem escrito no seu blog. (nada modestos, nem ele nem ela!!)
Eu já tinha lido o Rio das Flores e o maravilhoso Equador, ambos do mesmo autor, e olhando para aquela capa em tonalidades de azul aceitei sem pestanejar a oferta, ainda mais porque estava a caminho do aeroporto para encarar as duas horas e meia que separam a capital federal de Fortaleza e tinha terminado o livro que trouxera.
Não se encontra o que se procura não é um romance, não é uma biografia, é, talvez, um diário, sem o rigor que se espera de um diário. São lembranças, notas, críticas, percepções, pequenas histórias, relatos de viagens e comentários dispersos por meio do qual Miguel Sousa Tavares se revela para o leitor, mesmo que não fosse este seu objetivo original. Mas quem sabe, seja objetivo de todo escritor.
Quando comecei a leitura tive a impressão que o autor se propunha a fazer pequenos relatos de suas viagens, boa parte delas relacionadas às suas atividades profissionais – participação em feiras literárias, lançamentos de livros, palestras e etc. – e não pude deixar de pensar que o Miguel Tavares tinha me roubado o livro que minha irmã Lília tanto me estimula a publicar.
Logo na apresentação do livro está lá: “Eu quero viver para escrever, viajar para escrever, olhar para escrever, estar vivo para escrever. Quero a África, a Ásia, as Américas devorando-me a cabeça”. Não sou de recorrer a citações literais neste blog, mas não podia ser mais parecido com o que eu sinto quando sento em frente ao laptop nas tarde-noites de domingo...
Mas não ficou só aí.
Na medida em que comecei a viajar com o livro, passando por tantos lugares já idos, pela sua admiração por Brasília, sua paixão pelo Brasil, suas excursões por África, seu amor por sua terra natal e a quase onipresença de sua mãe nas viagens e memórias, comecei a pensar que havia escolhido erradamente o título para este texto. Em lugar de brincar como título da menina que roubava livros deveria brincar com o do seu conterrâneo, emprestando o título da obra de Saramago: O Homem Duplicado.
Parecia que estava lendo as memórias que eu pretendia escrever quando chegasse aos meus 60 ou 70... 
Como não pensar nisso quando a primeira viagem que Miguel Tavares fez para fora de Portugal foi para a Espanha com sua mãe e está lá, nas suas memórias, como estará nas minhas, a experiência de ser apresentado ao El Greco e seu Enterro do Conde de Orgaz na visita a Toledo.
Ali no capitulo seguinte ou logo depois, nas criticas que faz à nova lei do divórcio aprovada em Portugal fico sabendo das duas separações e três casamentos (!), sem preocupar com a interveniência da Igreja. Como também ao contar a sua viagem para Veneza, para onde já fui, descubro que são três os filhos, sendo o mais velho e o mais novo, os homens e a filha a do meio. Mais exclamações!!!
E as viagens?!?!
Depois de Toledo, do sucesso como jornalista e escritor, e depois que descobriu a paixão pela caça e pelo off-road (aqui nada nos une) um desfiar de ir e vir em aviões...
O Brasil é destaque, ao longo de todo o livro, com muitas idas e vindas: Rio de Janeiro, Angra dos Reis, Paraty, Búzios, Tiradentes, Congonhas do Campo, Ouro Preto, Brasília (com direito a um capítulo sobre a cidade), São Paulo (com almoço no Figueira), Palmas, até um off road entre o Ceará e o Rio Grande do Norte estão nas memórias que Tavares me antecipa. Mas não são só essas!
Visitar o Parque Kruger na África do Sul sofrendo ao ter que dirigir na mão inglesa e a necessária passada por Nelspruit, (onde quase atropelei uma bomba de gasolina); admirar-se com o encontro de mundos e povos da indecifrável Istambul (tomando um suco de romã); perambular por Roma, achar um restaurante sem turistas e se deliciar com a cidade que a cada esquina te surpreende. 
Tudo está nas minhas memórias e nas dele.
Aproveitar a Espanha, percorrendo os corredores do Prado ou os andares do Rainha Sofia; se embasbacar com a beleza estonteante da Alhambra, tendo o cume da Sierra Nevada a velar por Granada; ou, estando em Barcelona, olhar criticamente à obra demencial (na versão de Tavares) de Gaudí: a interminável Catedral da Sagrada Família (que parece que agora foi dada por finalizada!).
Isto sem mencionar a viagem para a costa da Croácia que abre o livro e que eu tinha planejado para este ano, mas que acho que vai ficar para 2016. E que certamente estará nas memórias que Tavares vêm antecipando, me roubando o livro.
Mesmo nas referências portuguesas, tantas dele e tão poucas as minhas, me reencontro com Viana do Castelo e suas belas ruas calçadas; com Évora e o almoço no Fialho, tomando um Marquês de Montemor; da passagem por Vila Nova de Gaia, ao retornar a Lisboa do Alentejo ou a vista do Estádio do Dragão logo na entrada do Porto. Também lá estive.
Isto, sem falar na enorme dívida que tenho com minhas memórias de até agora não ter me obrigado a ir ao Algarve, visitar Sagres e as terras que ele, Tavares, tanto ama e que é uma constante ao longo do livro. 
Tudo isto parece com o que terei que escrever no futuro.
Não sei se outras pessoas que vierem a ler este livro experimentarão o mesmo, mas se este é um blog sobre livros e viagens, achei que poderia compartilhar com vocês a surpresa de viajar na minha história, lendo a história de outra pessoa.
Mas acho que é, essencialmente, para isso que uns escrevem e outros leem.

Pelo menos é assim para mim.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Camiñaras con la Civilización.





A inexorável marcha da civilização é uma das coisas que mais chama a minha atenção nas muitas viagens que fiz na América Latina. Note-se que não há um juízo de valor quanto se esta civilização é melhor que aquela ou se esse padrão de desenvolvimento é melhor. Nada disto!

Há apenas a constatação de um processo aparentemente inevitável de culturas se sobrepondo umas às outras – em geral de forma não pacífica – por todos os lugares por onde andei, especialmente pela América espanhola.

De norte a sul, do México à Patagônia, salta aos olhos dos viajantes esta constante superposição de culturas, impérios e civilizações, seja pela dominação econômica, pela cooptação política, pela repressão cultural, pela supremacia bélica ou pelo total holocausto de populações há anos instaladas em um determinado território.

No livro Camiñarás con el Sol, Alfonso Mateo Sagasta nos apresenta uma das facetas deste processo de histórico de culturas e civilizações se transformando ao contar, de forma romanceada, a história de Gonzalo Guerrero, um marinheiro espanhol cuja caravela naufragou nas imediações da Jamaica e seus sobreviventes acabaram sendo capturados e escravizados por guerreiros no Yucatán.

O incidente ocorre no ano de 1516, quando a civilização Maia que dominava aquela região do globo já entrava em decadência e quando a aventura de dominação espanhola no que hoje conhecemos como México era um projeto que levaria alguns anos para se concretizar. Durante o período que permaneceu no cativeiro Guerrero foi aos poucos se ajustando ao modo de vida dos seus captores e passou a compreender e auxiliar a tribo que o escravizava a se fortalecer num ambiente em que as diversas tribos e grupos de guerreiros viviam em permanente estado de confronto.

Logo o protagonista de Mateo Sagasta estava orientando os ameríndios nas táticas militares mais modernas que se adotavam nos exércitos europeus e, por conta dos sucessos obtidos nas muitas disputas e escaramuças que enfrentou, se convertendo em um dos principais líderes militares daqueles índios, garantindo supremacia entre as tribos do seu entorno e transformando seu pequeno exército em um dos principais obstáculos aos avanços dos exércitos de Hernán Cortez nas selvas de Yucatán.

O livro não tem tom de denúncia ou de revisionismo histórico, mas assume um viés pro-ameríndios já que a experiência é narrada – majoritariamente – a partir da perspectiva de um europeu que acaba por assumir e adotar para si a cultura dos locais, a tal ponto que quando teve a oportunidade de juntar-se ao exército espanhol, chance que seu colega de naufrágio e de cativeiro Jerónimo Aguilar logo aceitou, Guerrero preferiu ficar com seus guerreiros maias.

Tão destacada foi sua atuação nas guerras do Yucatán, especialmente aquela em que cruzou o golfo de Honduras para derrotar os espanhóis que tentavam ocupar a região, que quando Gonzalo Guerrero foi finalmente morto, isto vinte anos depois de seu naufrágio, o governador da Guatemala, muito aliviado, correu a informar à Coroa Espanhola do fato.

Mas o processo histórico de dominação e conquista que é pano de fundo para o livro e que nos serve de guia para viagens por toda a América espanhola não se resume à conquista das Américas pelos Europeus.

As mesmas trilhas e caminhos que seguimos nos tours na região mostram-nos a formação dos impérios americanos, como os Incas e os Astecas, que também recorreram às guerras, conquistas, sanções econômicas e outros instrumentos de cooptação para estender seus domínios sobre áreas que, até hoje, nos surpreendem, seja por sua extensão territorial, seja pela complexidade dos recursos necessários para bem gerenciá-los.

Apesar do livro se passar na região Maia, principalmente sul do México e Guatemala, é na cidade do México e suas imediações que melhor eu pude observar ilustrações deste processo de conquista e dominação, principalmente na visita ao Museu Nacional de Antropologia e no passeio pelas maravilhosas ruínas de Teotihuacan, a cidade onde os Deuses foram criados.

Localizado em uma área nobre da cidade do México, em meio ao Parque Chapultepec, o Museu Nacional de Antropologia é formado por um conjunto de quatro prédios – me lembraram prédios do estilo do Niemeyer em Brasília, com muito concreto – em torno de um pátio que permitem ao visitante uma tour que parte do período em que os americanos ainda conviviam com os mamutes e passa por as muitas civilizações e culturas que formam a cultura do país.

Astecas, Maias, Olmecas, Teotihuacanos e Toltecas, além de muitas outras tribos e suas manifestações culturais estão ali expostos numa organização que ao mesmo tempo os distribui geograficamente, mas também tenta mostrar como uma civilização sucedeu a outra, aproveitando de seus desenvolvimentos e superando-as em suas conquistas e avanços, até a chegada dos espanhóis.

Saindo do museu, cortando o trânsito sempre complicado da maior metrópole da América Latina no sentido norte, o visitante se dirige para o que deve ter sido a maior cidade da região durante o primeiro milênio depois de Cristo: Teotihuacan. Construída entre o primeiro e sétimo séculos depois de Cristo, a cidade sagrada é impressionante, mas que isto: é monumental!

Imagine-se em uma avenida larga cercada por prédios imponentes de lado a lado, com uma extensão de mais de dois quilômetros, tendo seu início na cidadela, onde está o Templo de Quetzalcoatl e, na outra extremidade, é coroada pelas majestosas pirâmides do Sol e da Lua.

Cuidando para não perder o fôlego, seja por conta da impressionante beleza do lugar, seja por conta dos efeitos da altitude, suba os muitos degraus da pirâmide do Sol, a mais alta delas, e lá de cima contemple todo o maravilhoso espetáculo que se apresenta e que, sem dúvidas, convida à reflexão.

Com isto em mente, se pergunte como uma civilização, um povo, conseguiu construir tamanha maravilha há mais de 1500 anos atrás! Ou ainda, como e porque uma civilização tão impressionante subitamente desapareceu da face da terra e só mais de 1000 anos depois as ruínas deste impressionante complexo arquitetônico foram descobertas.

Não há como não especular sobre o inevitável processo da ascensão e descenso de povos e culturas. Não tem como não se perguntar se todo o conhecimento que permitiu a existência de Teotihuacan simplesmente se perdeu ou será que os Mexicas e Astecas, grupo de nômades, vindos do norte, que séculos depois transformaram uma área pantanosa onde encontraram uma águia devorando uma cobra em cima de um cacto na capital do maior império das Américas não se aproveitaram desta experiência histórica.

Antes de sair do complexo, dê uma passada no pequeno museu que existe e que abriga algumas peças e informações sobre a cidade – as melhores peças estão no Museu Nacional de Antropologia já visitado – especialmente a bela maquete que dá uma dimensão bem mais objetiva do tamanho e da complexidade dessa sociedade há muito desaparecida.

De volta à Cidade do México, outras muitas evidências deste processo de interação e submissão de culturas e civilizações vão aparecendo a cada olhar, a cada passeio.

Como na visita à Plaza de Armas da cidade, com a curiosa vizinhança entre a Catedral e o antigo Templo Asteca onde Montezuma teria sido assassinado por Cortês, num processo de conquista em que os espanhóis contaram com o decisivo apoio de muitas outras tribos de ameríndios que há anos eram submetidos pelos Astecas e viram na chegada dos europeus a chance de se livrar do jugo de seu inimigo histórico.

Mesmo quando a vitória parece se voltar contra o conquistador, como nas muitas derrotas que Gonzalo Guerrero aplicou sobre seus compatriotas espanhóis, ainda assim o processo de dominação se apresenta, já que para transformar os guerreiros Maia em vencedores, Guerrero teve que treiná-los para adotar táticas e conceitos de guerra que eram tão alienígenas para aquele povo quanto os cavalos que os espanhóis chegaram montados e as armas de fogo que utilizaram.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Os Enigmas de Chartres.



Uma das minhas manias de viagem é a de comprar livros que tratem da história ou de aspectos da vida dos países ou cidades que visito. Esta mania tem me ajudado a descobrir curiosidades e muitas coisas interessantes de tais lugares, como na viagem que fiz à França para comemorar os 70 anos de meu pai.

Numa tarde chuvosa, em que as mulheres preferiram investir nas compras numa dessas Zaras da vida, entrei em uma livraria e acabei por comprar uma edição de bolso do livro “Le Régent, Le Guerrier Libertin” de Patrick Pesnot, jornalista e escritor francês conhecido em suas terras pela autoria de romances históricos “trés documentes”, como explica sua apresentação.

O guerreiro libertino é o primeiro volume da história do Duque Felipe II de Orleans, sobrinho de Luis XIV, o famoso Rei Sol, aquele que nos velhos livros de história era apresentado como o símbolo paradigmático do absolutismo, autor da igualmente famosa e nada modesta frase: “O Estado sou Eu!”

O maior desafio desta minha experiência foi enfrentar uma história escrita em francês tendo como ferramenta o meu francês “achado na rua”, que não sabe sequer diferenciar o passado e o presente do futuro!

No início da minha tarefa, que logo se mostrou hercúlea (o livro tem mais de 400 páginas), recorri ao auxílio de um dicionário, mas como não conseguia avançar, acabei abandonando esta estratégia e me conformando em entender o sentido da história, perdendo a riqueza dos detalhes e dos ferinos comentários que o autor colocava na boca das personagens.

Apesar da minha deficiência no idioma logo ficou claro que a trama narrada por Pesnot se desenvolve em torno do esforço de Felipe, duque de Chartres (ele só vira duque de Orleans quando seu pai, o primeiro duque falece), de desvendar o enigma da sobrevivência em uma corte mesquinha e invejosa, cheia de fofocas e puxa-sacos e de um rei que governava e decidia em função do seu humor e sob forte influência de suas amantes, especialmente, da poderosa M. de Maintenon.

Apesar de sobrinho legítimo do rei, herdeiro das coroas de França e Espanha, filho de um dos homens mais ricos da França e de uma princesa alemã, Felipe logo aprende que em um ambiente como a corte de Versailles desempenhar com sucesso suas tarefas nem sempre é motivo de promoção e reconhecimento.

Na verdade, quanto mais bem sucedidas foram suas campanhas nos campos de batalha mais seus inimigos envenenavam o rei e seus herdeiros, com o argumento de que ele seria uma ameaça à sucessão e que ambicionava tomar para si a coroa e o amor dos seus súditos.

Nisto o livro de Pesnot se mostra extremamente atual! É impressionante notar que trezentos anos depois da morte de Luis XIV a política cortesã continua tendo as mesmas características, com um exército de puxa-sacos distorcendo o julgamento do rei de plantão, fazendo com que seja mais negócio ser um cortesão dócil e inofensivo, do que ser um gestor eficiente e dotado de luz própria.

Como avisava Augusto dos Anjos há mais de cem anos: a mão que afaga é a mesma que apedreja!

Demorou um tempo para que Felipe decifrasse o enigma sobre quem estava por trás dos constantes reveses políticos que ele sofria mas, quando ele estava no fundo do poço, quando sua conduta libertina e sua nem sempre bem disfarçada ambição pela coroa espanhola – sim, ele tinha sua parcela de culpa – tinham servido mais uma vez aos seus adversários para manchar e corromper sua imagem perante o tio-rei, ele se vê bafejado pela sorte, se é que se pode chamar a morte de familiares próximos de sorte.

Entre 1711 e 1712 morreram vítimas de um surto de escarlatina: o Delfim (ou seja, o príncipe herdeiro), pai do Rei de Espanha, primo legítimo de Felipe e um dos seus principais adversários na corte; o filho mais velho do Delfim, que seria o segundo na linha de sucessão real e sua esposa; e, também o neto mais velho do rei Luis XIV. De repente, em menos de um ano, morreram os 3 primeiros nomes na linha de sucessão real e o próximo herdeiro – que seria o futuro Luis XV – tinha apenas 2 anos de idade.

Claro que os adversários de Felipe viram nesta sucessão de adventos fatais o risco a que estariam expostos e trataram de acusá-lo de ter envenenado toda a família real. Diante do absurdo da acusação, quando Luis XIV morre em 1715 deixando como herdeiro seu bisneto com apenas 5 anos de idade, Felipe se torna o Regente e o todo poderoso da França, mostrando a face igualmente enigmática e surpreendente da política.

Apesar de Felipe ser o duque de Chartres, a cidade só aparece na história no título honorifico da personagem principal. A maior parte dela se passa em Versailles, onde Luis XIV mantinha sua corte, no Palácio de Saint Cloud, residência do Duque de Orleans e no Palais Royal, que era a casa da família Orleans na cidade de Paris.

Chartres é uma pequena cidade nas imediações de Paris e é uma das alternativas de caminho para aqueles que saem da capital francesa para o Vale do Loire (a outra, mais usada, passa por Orleans). Com um centro histórico bem preservado, a cidade convida o turista para boas caminhadas em suas ruas de paralelepípedos e para aproveitar da paz e da tranquilidade que é garantia para quem a visita.

Sua principal atração é a catedral consagrada a Nossa Senhora, que foi construída no século XII, tendo sido reconstruída algumas vezes nos seus quase mil anos de existência. O edifício atual é de 1260, com importantes acréscimos realizados durante o século XVI.

 Além de representar o auge da arquitetura gótica francesa, a catedral é visitada anualmente por milhares de turistas interessados nos seus magníficos vitrais, pois na Notre Dame de Chartres está o mais importante conjunto de vitrais do século XIII que pode ser apreciado, em toda sua beleza, durante um passeio pela nave da igreja num fim de uma tarde de outono.

São tantas e tão variadas as histórias contadas por meio dos vitrais que justificam o título de “a Bíblia feita de pedra” com milhares de estátuas e de personagens bíblicos representados tanto nos vitrais como nas fachadas do templo. Ainda que não seja um enigma, não há como decifrar todas suas referências ao Livro Sagrado sem o apoio de um guia ou dos panfletos que ficam à disposição dos turistas.

Depois de ver a catedral o visitante pode voltar a passear pelas ruas do centro da cidade e aproveitar para fazer um lanche rápido antes de seguir sua viagem porque, apesar da beleza da catedral e da tranqüilidade do centro da cidade, só se passa por Chartres a caminho de outro lugar: como no caso do nosso romance, Felipe foi Duque de Chartres até virar Duque de Orleans, mas queria mesmo era governar a Espanha e a França.